quinta-feira, 23 de setembro de 2010

breve história de um lenhador

Nas manhãs mornas, Solidônio tinha seu enorme prazer garantido, acendia o fogo e colocava a velha chaleira para ferver, sentia o cheiro do café estendendo-se pelo ar, deixava o cão entrar - um vira-lata marrom de meia-idade - e dava-lhe comida. Tudo que lhe vinha a mente era amainado por essas simples sensações, numa vida básica de se viver.
Cedo, começava a limpeza, pegando roupas pelo caminho, varrendo sob a cama vazia, os pratos sob a água fresca da torneira, não lustrosa, mas conservada. A casa não ostentava, nem seus moradores, o cão mal negava sua origem boêmia das ruas, era limpo e bem cuidado, mas simples, como um cão deve ser. O homem da casa era rústico, porém cortês, bem instruído, ainda que de uma defasada formação escolar - ali tudo se continha, mesmo para quem viesse de longe, como um estranho em terras estrangeiras jamais visitadas até então, notaria que o lar era parcimonioso, mas completamente alinhado, consonante com o que portava. Com alguns anos, formavam a visão completa de um lar, como se não houvesse o que preencher para se tornar inteiro.
Toda manhã, Solidônio saia para trabalhar, machado em mão, chapéu e lenço. Gostava de, caminhando, conversar com os pássaros e ouvir suas notícias distantes, para perceber que o pouco lhe bastava, como as aves voando sem direção atrás do sol, dos frutos caídos, de uma lufada.

- Vou viver como os pássaros, dizia.

E ele foi.

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